Luísa Sonza — Foto: Carlos Teixeira
Foi uma semana especial para Luísa Sonza. Na véspera do show que faria no Rock in Rio Lisboa,a cantora gaúcha chegou ao Altis Avenida Hotel,onde foram feitas as fotos deste ensaio,tendo alcançado um inédito primeiro lugar no Spotify Portugal,com “Sagrado profano”. A música também estava no topo das mais tocadas no Brasil,tornando “Escândalo íntimo” o primeiro álbum pop brasileiro a ter três canções que atingiram o patamar.
O momento não poderia ser melhor. E não só pelos feitos da carreira da gaúcha de 25 anos. Depois de um período de hiperexposição,Luísa está superando uma depressão profunda. Alvo fácil de haters nas redes sociais,especialmente em relação à sua vida pessoal,viu os relacionamentos com Whindersson Nunes,Vitão e Chico Moedas virarem objeto de escrutínio público,mas vem transformando críticas em combustível para sua arte. Agora,namorando o médico português Luis Ribeirinho,demonstra até na pele estar bem e tranquila consigo mesma.
Luísa Sonza — Foto: Carlos Teixeira
Tranquila em termos. Cada vez mais engajada,a cantora tem usado sua influência (só no Instagram são mais de 30 milhões de seguidores) em prol de questões humanitárias. Na tragédia do Rio Grande do Sul,fez doações,mobilizou amigos e disponibilizou sua equipe para ajudar in loco. O festival Salve o Sul,idealizado por ela,arrecadou R$ 8 milhões em vendas de ingressos. Mais madura,consciente e “assentada”,Luísa tem posições claras com relação a temas polêmicos,como a PL do aborto e a descriminalização das drogas,como conta na entrevista a seguir,em que revela também o sonho de alçar voos mais altos na carreira internacional. Portugal,pelo visto,a brasileira já conquistou.
Você foi capa da ELA em 2018 e em 2022. Na primeira entrevista,disse que não ligava para moda,que só tinha uma Vuitton. Continua assim?
Não (risos). Sou uma fashionista que ama,inclusive,bolsas. É o que eu mais gosto de comprar. Mas também gosto de moda consciente,de peças de brechó. Estou mais consumista de um ano para cá,quando comecei a investir mais na Luísa pessoa. Antes eu estava numa correria para conquistar a Luísa Sonza carreira. Sigo nessa busca,só que de uma maneira mais tranquila. Agora,tenho mais tempo reservado para mim. A Luísa pessoa quase foi deixada de lado,o que acabou indo até para uma depressão. A retomada desse cuidado comigo me fez gostar de moda,inclusive.
Com a depressão,perde-se a autoestima?
Nunca me senti inferior. Na música “Luísa Manequim”,falo que “até feia eu sou bonita”. Mas cheguei a perder quase completamente o cuidado comigo. Só não perdi porque,pela carreira,eu precisava estar maquiada,bem-vestida. Quando comecei a me curar da depressão,voltei a cuidar do cabelo,da pele...
Luísa Sonza — Foto: Carlos Teixeira
Como tem tratado a depressão?
Sou acompanhada por um psiquiatra. E tomo remédio. Muita gente abomina o remédio,mas,às vezes,a química do cérebro está desregulada. Então,por um tempo,a medicação é importante. Em excesso,realmente é prejudicial. Tive uma fase em que precisei de muito remédio. Hoje,não tomo nem metade do que já tomei e faço terapia. Nunca estive tão tranquila.
Como é estar na sua mente?
Eu penso bastante. Não sou aquela pessoa que senta e medita. Consigo fazer ioga e gosto de ficar sem fazer nada. Amo estar com os meus cachorros e gatos. Quando não estou em São Paulo,choro de saudade,faço chamada de vídeo... Ainda penso muito na minha carreira. É o grande amor da minha vida. Acho que é por isso que eu me jogo muito nos amores: sinto que já sou casada com a minha carreira e comigo mesma de tal maneira que não me importo em me jogar. Já tive períodos de mais fragilidade emocional. A galera fala muito que sou dependente emocional,que namoro demais... Mas,na realidade,sofri por ser dependente emocional da minha carreira,não de homem. Isso foi me adoecendo,porque,para cuidar da “Luísa Sonza”,cantora,preciso cuidar de mim antes.
Você fez um show e segue engajada em ajudar o Rio Grande do Sul. Como isso mexeu com você?
Valorizo muito as minhas raízes. Quando vi aquele lugar sendo destruído,passei a ver todas as avós como a minha avó. Quando vi que não estava dando conta,comecei a chamar amigos. Um milhão e meio de reais ia embora igual água,em um dia... Então,vi que era preciso mobilizar mais e me uni a quem tem expertise,como a Cufa. E aí veio festival,vaquinha,a criação de um abrigo só para mulheres. Não fui pessoalmente no início porque achei que a minha ajuda de longe seria mais efetiva. Fui depois,até para me assegurar de que o dinheiro está indo pro lugar certo. E também fui pegar a gatinha que adotei lá,Elis Regina.
Luísa Sonza — Foto: Carlos Teixeira
Como vê o projeto de lei que equipara aborto a homicídio?
É um retrocesso que me deixa chocada. O Estado é laico,então ter uma bancada religiosa,uma bancada evangélica,é um absurdo. Um desrespeito inclusive com as outras religiões. Cada um pode ter a sua fé. Só que não tem que interferir na saúde pública.
Você já fez aborto? Faria?
Não,nunca fiz. Faria sim se acontecesse em alguma situação que não fosse desejada.
Portugal é exemplo na regulação das drogas. É a favor da descriminalização no Brasil?
Não tem como comparar. O Brasil tem suas próprias questões. Porém,devemos sim analisar como qualquer exemplo bom pode ser aplicado na nossa realidade. Sou a favor da regulamentação,principalmente da cannabis. Isso deve ser debatido para diminuir a criminalidade e beneficiar os casos medicinais. A bebida é extremamente prejudicial,vicia,destrói vidas e está regulamentada. A criminalização das drogas é algo muito hipócrita e mercadológico também.
Luísa Sonza — Foto: Carlos Teixeira
Está mais consciente da sua influência?
Acredito que a política é necessária para nossa sobrevivência. Busco me informar,para formar minha opinião e ser mais consciente no voto. Política deveria ser ensinada nas escolas. Até porque a gente começa a votar com 16 anos. A gente precisa de mais diversidade,até para acabarmos com essa visão de o político ser um cara branco,velho,de terno e gravata. Para mim,a (deputada) Erika Hilton devia ser presidenta do Brasil.
O doc “Se Eu fosse Luísa Sonza” chegou no TOP 10 global da Netflix. Terá segunda temporada?
Deus me livre! Foi um processo muito sofrido falar sobre traumas. Foi fechado um ano antes. E calhou de as filmagens serem no pior momento psicológico que poderia estar.
O curta “Escândalo Íntimo — O filme”,que você lançou no seu canal no YouTube,tem cenas fortes. Vemos o nascimento de uma atriz?
Respeito muito a carreira de atriz e não tenho nem DRT. Sou boa em interpretar o que canto,escrevo e sinto para potencializar a minha música... Quem sabe um dia?
Luísa Sonza — Foto: Carlos Teixeira
Há cenas de nudez. Sente-se à vontade?
Não. Sou tímida e envergonhada sexualmente,embora minhas músicas falem de sexo. Acho que é uma forma de me empoderar. Não gosto daquela coisa de sexo performático. Acho que só sei flertar cantando (risos). Quando estou solteira,não flerto,vou direto ao ponto. Até porque você acha que alguém me aborda? O povo morre de medo de ficar comigo.
Você se disse 100% bissexual,mas ainda não namorou uma mulher. Por quê?
Agora,estou namorando. Então,nem penso nisso. Mas já me apaixonei,já tive casos com mulheres. Não falo tanto sobre isso porque temo descontextualizarem. Há uma pressão,as pessoas rotulam,falam que sou “bi de festinha”. Sempre tendenciei a me relacionar com homens até pelo preconceito da minha família,por medo de muita coisa. Acabamos bloqueando sentimentos. Porém,agora estou feliz.
Você já foi muito longe. Aonde quer chegar?
Quero muito ter uma carreira internacional. Aqui em Portugal já é o comecinho. Quero levar a música do Brasil para outros lugares. Não necessariamente cantando em inglês ou espanhol. Queria mesmo era conseguir fazer uma música em português ficar grande aqui fora. É possível,a bossa nova provou isso.
Qual pergunta nunca te fizeram e você gostaria de responder?
Sobre as minhas composições. A minha intenção não é ser o Chico Buarque,mas tenho produções muito legais. É difícil vermos a mulher neste lugar de compositora. “Chico”,por exemplo,era uma pessoa por quem eu estava apaixonada,mas não era o foco da música. Não me afeta ter uma música com o nome de qualquer pessoa,mesmo alguém que não vale nada. Tem várias canções com nomes de mulheres,como “Ana Júlia”... Por que as mulheres também não podem criar uma música com o nome de um homem sem serem vistas em um lugar de coitada? O dinheiro vai todo para mim.